Lei permite que agricultores familiares saiam da informalidade, vendendo no município de origem com imposto mais baixo
Uma tradição mantida há décadas por milhares de famílias da Serra, a fabricação de vinho colonial agora começa a sair da informalidade. A partir da Lei do Vinho Colonial, de caráter federal e em vigor desde 2014, mas que somente agora começa a ser implementada, uma série de produtores deve se legalizar. Os primeiros registros de agroindústrias familiares já estão sendo distribuídos neste ano pelo Ministério da Agricultura.
Até o momento, três vinícolas de agricultores familiares, duas em Garibaldi e uma em Bento Gonçalves, receberam o registro. Elas integram o projeto-piloto conduzido por Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin) e Emater. A relação ainda inclui três propriedades que solicitaram o documento e outras 10 que estão na fase final de coleta da documentação. Nos próximos meses, todas devem receber o aval do ministério.
Segundo o chefe do escritório da Emater em Bento Gonçalves, Thompson Didoné, a experiência deste primeiro grupo serviu para sanar dúvidas relativas à lei e para criar diretrizes que servirão de base para o registro de novos estabelecimentos.
– Como é uma legislação relativamente nova, tivemos que construir uma série de normativas. Todo um processo foi construído. A partir de agora, com a documentação em mãos, o produtor poderá ter o registro em questão de meses – salienta Didoné.
Para pleitear a formalização, é preciso obedecer a alguns critérios. O volume fabricado não pode passar de 20 mil litros ao ano, 100% das uvas devem ser de cultivo próprio e a venda só é permitida na propriedade e em feiras municipais. Não é preciso CNPJ, pois as notas podem ser emitidas com o talão de produtor. Além disso, é necessário respeitar critérios ambientais, fiscais e sanitários. O custo para montar a agroindústria varia, mas, em geral, oscila entre R$ 30 mil e R$ 100 mil, calcula Didoné.
Segundo o último Censo Agropecuário divulgado, realizado pelo IBGE em 2006, há mais de 8 mil produtores de vinho artesanal no país, a maioria na serra gaúcha. Desses, 2 mil forneciam ou comercializavam a bebida para terceiros e poderiam se beneficiar da legislação.
– É uma prática cultural antiga, principalmente na Serra. Cada agricultor, mesmo que venda a uva, produz algo de vinho, muitas vezes para consumo próprio – lembra Carlos Paviani, diretor de relações institucionais do Ibravin.
Nos próximos três anos, o instituto projeta que, ao menos, 200 vitivinicultores da Serra serão registrados, o que resultaria em uma produção anual de mais de 4 milhões de litros de vinho.
Os pioneiros
Com 16 hectares de parreirais em Faria Lemos, no interior de Bento Gonçalves, Auri e Diva Flâmia estão entre os pioneiros a obterem o registro. O documento foi entregue em fevereiro.
O casal investiu em torno de R$ 70 mil na reforma do galpão que abriga a vinícola e na compra de equipamentos. A principal fonte de renda da família Flâmia segue sendo a venda da uva para vinícolas da região, mas a produção própria vai potencializar os rendimentos.
– Fazer vinho dá mais trabalho, mas conseguimos ganhar mais. Com mil quilos fazemos mil litros de vinho e ganhamos cinco vezes mais do que vendendo a mesma quantidade de uva para a cantina – compara Auri Flâmia.
Na primeira safra com a marca regulamentada, a Piccola Cantina, nome que os Flâmia deram ao negócio, está fazendo 16 mil litros da bebida. Entre as variedades disponíveis há bordô, isabel, isabel branco, lorena, moscato e niágara.
O pioneirismo tem rendido bons frutos para os produtores. Diva Flâmia conta que até pessoas de municípios distantes, como Porto Alegre, São Leopoldo e Passo Fundo, apareceram na propriedade para comprar vinho.
– Tudo isso vale a pena. Tivemos um gasto alto, mas sabemos que estamos trabalhando dentro das normas. Ficamos mais tranquilos – comemora Diva.
À espera da primeira safra
Após ter centenas de litros de vinho apreendidos em uma ação de fiscalização, a família Lazzari viu que havia chegado a hora de legalizar a fabricação da bebida na sua propriedade localizada em Marcorama, no interior de Garibaldi. Era 2012 e, na época, se começava a discutir a implementação da Lei do Vinho Colonial. Quando a legislação entrou em vigor, anos depois, Aldo e Adriana Lazzari não hesitaram em iniciar a busca pelo registro.
Fonte: Gauchazh